Teresa Giménez-Candela, professora catedrática na Universidade Autónoma de Barcelona, lançou o primeiro curso de pós-graduação em Direito Animal em Espanha. Além de coordenar um grupo de investigações, é também a responsável pela cadeira “Direito Animal” desde há cinco anos na UAB, a única universidade espanhola a incluir esta matéria nos seus planos de estudo. Países como os Estados Unidos, Canadá ou Austrália já o fazem há muito tempo. Em entrevista ao jornal La Vanguardia, Teresa Giménez-Candela defende punição mais severa para quem abandona cães e gatos.
Animais e escravos têm algo em comum.
O direito romano incorporou-os em simultâneo no sistema jurídico e ambos estavam sujeitos ao mesmo tratamento processual. Eram considerados objectos, pelo que os anos podiam dispor, usar e abusar deles como entendesse. Por serem considerados “coisas”, quando praticavam algum delito ou causavam algum dano, o responsável último era sempre o amo. Este é o ponto de origem do que hoje se denomina de “responsabilidade por danos a terceiros”.
Em 1789 ocorre um ponto de inflexão graças a Jeremy Bentham. O filósofo britânico escreveu uma obra jurídico-filosófica com muita repercussão, em que defendia o voto das mulheres, a despenalização da homossexualidade, a abolição da escravatura e o tratamento igualitário dos animais.
Pouco a pouco, as suas reivindicações foram sendo cumpridas.
Menos a quarta. No Ocidente pensamos que os animais não têm direitos devido à sua incapacidade de falar e de raciocionar. Bentham critica este esta ideia argumentando que os animais também sofrem. Também há seres humanos sem razão e que não falam.
Mas continua a não se responder à quarta premissa.
Contudo, de maneira paulatina, os animais deixaram de ser considerados objectos e passaram a ser sujeitos. Esta é uma mudança que já aconteceu em muitos países e que acabará por se generalizar.
Qual o sistema jurídico que tem mais consideração pelos animais?
O alemão,o suíço, o austríaco e o catalão, que nos seus códigos civis ou constitucionais declaram que os animais não são coisas. Este é o primeiro passo para que se cumpra o que está firmado no Tratado de Lisboa e já reonhecido no de Amesterdão :”O animal é um ser sensível e, tendo em conta essa sensibilidade, não se pode tratar como mero objecto”.
Que consequências teve esse reconhecimento?
Se te hipotecam a casa, não podem levar-te o cão! Outro exemplo: os animais domésticos deveriam receber uma maior protecção quando são adoptados.
Que tipo de protecção?
Nos Estados Unidos, o adoptante está obrigado a seguir parâmetros de bem-estar, ou seja, a associação protectora garante, antes de dar o animal, que o adoptante tem conhecimentos suficientes para uma adopção responsável. Contrariamente a Espanha, onde os esforços se centram no seguimento e controlo posteriores.
Em que consiste uma adopção responsável de animais?
Na obrigação de os alimentar, de lhes dar uma vida digna, de não os usar como objectos comerciais, dar-lhes liberdade de movimentos e não permitir que sofrar desnecessariamente. O ordenamento jurídico britânico incorporou-o no século XIX e a União Europeia também o fez.
Embora nem todos os países membros o cumpram...
Não, mas foram dados passos gigantes nesse sentido. Em espanha, a lei 32/2007 regula e permite a inspecção durante o transporte, a matança e a experimentação animal. A partir de 2011, será proibida a criação de galinhas em cativeiro.
A União Europeia incorporará directivas gerais sobre o tratamento e a prevenção do abandono animal a partir do próximo ano.
Sim, embora não estejamos assim tão longe de cumprir os objectivos. O que se passa é que a inclusão do animal de companhia na história da humanidade é muito recente. A concepção que predomina é que o animal tem que servir para alguma coisa, por isso abunda o abandono, entre outras razões.
Em primeiro lugar, a realização de estudos e de estratégias de prevenção; em segundo lugar, o animal de companhia deverá integrar a vida quotidiana com mais normalidade. Deveria poder viajar nos transportes públicos, alojar-se nos hotéis e entrar nos diversos locais. Isso sim, sem incomodar os restantes cidadãos e cumprindo normas mínimas de comportamento. Há países onde, mediante o pagamento de um imposto, são oferecidos cursos de educação urbana para cães.
Considera que o abandono é suficientemente penalizado?
A multa não chega aos 1000 euros, e apenas é punível o abandono que ponha em perigo a vida e a integridade física do animal. A aplicação de uma pena depende, em grande medida, da formação, do sentimento e da vontade do juíz.
E quanto à matança de cães e gatos nas associações de protecção?
Neste aspecto, em espanha existem grandes diferenças. A Catalunha é a única comunidade autonómica que já proibiu a eutanásia nos canis. Sendo uma obrigação, não está a ser aplicada com todo o rigor já que os meios são insuficientes. Por esta razão, outras comunidades permitem o sacrifício automático sem qualquer prazo para adopção.
Como compatibilizar o respeito pelos direitos dos animais com o sacrifícios daqueles de que nos alimentamos?
A dieta ocidental está muito dependente da proteína animal, e embora tal não signifique comer saudavelmente, influenciou a criação de animais em cadeia, o que é completamente desumanizado. Muitos vivem em espaços onde não se podem mexer, os membros atrofiam-se, viajam quase sem possibilidade de respirarem, abusos que devem ser corrigidos com uma legislação mais restritiva, um aumento das inspecções e uma maior profissionalização do sector.
As largadas de touros irão acabar. Isto porque a sensibilidade social se vai alterando aos poucos. Há uns anos, ninguém questionava o facto de os circos utilizarem animais nos seus espectáculos, até que foi interposto um processo contra Ringling Brothers Circus, um dos circos mais famosos do mundo.
As más condições de vida dos animais que exibiam nos seus espectáculos, pois tinham que suportar maus tratos e castigos muito severos. Nenhum elefante sobe a um tamborete voluntariamente.
Que mudanças se verificaram?
A partir daquele momento, muitas cidades dos Estados Unidos negaram-se a receber circos que utilizavam animais nos seus espectáculos.
E menos animais foram explorados...
Se os animais sonham, o seu sonho é livrarem-se de umas condições de vida que são péssimas na maioria dos casos.
Fonte: http://www.jn.pt/blogs/osbichos/archive/2011/02/07/professora-catedr-225-tica-espanhola-defende-puni-231-227-o-mais-severa-para-quem-abandone-animais.aspx
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